Apagar a lâmpada

O poeta Tagore questionava num poema:
Qual o motivo de se ter apagado a minha lâmpada?
―Puseste-a debaixo do manto para a proteger do vento…

Qual o motivo de ter murchado a minha flor?
― Apertaste-a contra o coração para a conservar só para ti…

Qual o motivo de ter secado o meu rio?
― Cortaste-o com um dique para seres o único a servir-te dele…

Qual o motivo de se ter quebrado a minha harpa?
― Tentaste desferir uma nota superior ao seu poder de vibração...

O nosso egoísmo apaga as nossas lâmpadas, apaga a nossa luz, impede a nossa missão iluminadora do mundo que nos rodeia. Qualquer pequeno manto de cobardia, de medo, vergonha, negligência, abafa o nosso testemunho. Se apertarmos as nossas capacidades no interior de nós mesmos e não as disponibilizarmos aos outros, fechamos demasiado o nosso jardim e a nossa generosidade murcha. O egoísmo cria vidas áridas, insensíveis, inúteis. Seca a corrente da solidariedade, da partilha, do serviço aos outros. Há tentações de vaidade que nos fazem julgar superiores aos outros, criticar e desvalorizar o que fazem os outros. Esta presunção, esta ânsia de superioridade, faz desafinar a nossa harpa e destoar o cântico da vida.


(SALGUEIRINHO, Mário - Rezar com a Vida.Porto: Telos, 2000)

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